Da Fitoterapia aos Fármacos: descubra como os medicamentos são produzidos
Compreenda melhor o passo a passo que vai da fitoterapia aos fármacos atuais.
A longa jornada da morfina faz parte da história da fitoterapia
No post sobre fitofármacos/fitoterápicos falei sobre 2 substâncias naturais (codeína e morfina) presentes no ópio e que são chamadas de fitoquímicos. O conhecimento da estrutura molecular de um fitoquímico leva, posteriormente (através de experimentos e pesquisas), à síntese de outros compostos úteis para a prática médica. No caso da #morfina levou-se 120 anos¹, desde o seu primeiro isolamento em 1805, para que se estabelecesse a estrutura química dessa substância, e outros 30 anos para a sua síntese total em 1956.
A síntese total da morfina, em laboratório, levou à criação do fármaco Fentanil (10 mil vezes mais potente do que a morfina isolada) que hoje é utilizado, por exemplo, na sala de emergência para intubação oro traqueal e sedação. Não somente isso, mas a compreensão da estrutura molecular da morfina e de outros opiáceos levou também ao entendimento do funcionamento dos receptores opioides nas células e à descoberta de substâncias semelhantes chamadas de opioides endógenos (produzidos pelo nosso próprio corpo). Veja na foto abaixo² alguns exemplos de opioides endógenos:
O desenvolvimento de novos fármacos é um longo e dispendioso processo, que pode levar de dez a quinze anos de pesquisa e desenvolvimento para ser concluído. Ao longo desse processo, a taxa de insucesso é muito alta: dos 5.000 – 10.000 compostos inicialmente testados, 250 chegam aos ensaios pré-clínicos (ou seja, em animais ou in vitro), apenas 5 alcançam os ensaios clínicos (ou seja, em seres humanos), para a partir daí resultar a aprovação de uma única droga.
É extremamente gratificante trabalhar como médico no departamento de emergência e poder ter em mãos um fármaco analgésico tão poderoso quanto o #Fentanil. Após qualquer acidente grave, quando o paciente chega gritando de dor com uma fratura exposta, ou quando a pessoa em estado grave necessita ser intubada e respirar por meio de ventilação mecânica (pela insuficiência do sistema respiratório) o fentanil estará entre os fármacos disponíveis, dentro do arsenal da Medicina Moderna, para o controle da dor e sedação.
Ao mesmo tempo, também me fascina poder estudar o poder das plantas medicinais em livros antigos como o Carak Samhita (ou também a Farmacopéia Brasileira) e poder comparar, através de ensaios clínicos randomizados duplo cego, por exemplo, o efeito de um fármaco e uma droga vegetal (como o exemplo a seguir ou como os diversos ensaios clínicos citados nesse livro de fitoterapia).
Um estudo comparou o efeito do gengibre em relação ao sumatriptano (um dos fármacos de escolha para o alívio da dor na enxaqueca) e mostrou que ambos são efetivos no alívio da dor. O #gengibre apresentou menos efeitos adversos (cerca de 4% das pessoas do estudo referiram certo desconforto leve no estômago), mas quando comparado ao sumatriptano (em que 20% das pessoas relataram efeitos indesejados como tontura, efeito sedativo, vertigem e dor retroesternal) o gengibre parece mais seguro e barato.
Importante lembrar também que diversos estudos já mostraram vaso espasmo coronariano, Infarto Agudo do Miocardio e arritmias fatais associados ao uso de sumatriptano, algo que deve ser levado em consideração pelo médico na hora de prescrever esse fármaco.
Integrar a ciência atual ao passado (que tem se mostrado valido até hoje) é fascinante, mais ainda é compreender em profundidade as características das plantas medicinais e as diferenças entre uma droga vegetal, fitoterápico, fitofármaco ou fármaco, para saber quando, como e onde cada uma dessas formas de apresentação serão realmente necessárias.
Minutos na ambulância a caminho do hospital podem ser uma eternidade, caso a dor não seja erradicada rapidamente por um fármaco potente na veia, não importa aqui se estou na ambulância como médico ou paciente. Se devido a um acidente ou algo parecido eu chegar um dia na sala de emergência, tomara que os estoques de fentanil do pronto-socorro estejam em ordem!
Agora, se minha cabeça começar a doer, seja de preocupação, falta de sono ou resultado de algo que não foi bem digerido (na forma de alimentos ou emoções), seja por uma dor de barriga estranha porque comi algo que não caiu bem, eu recorro/ recorrerei ao: Śuṇṭhi para os íntimos, Ārdraka para quem sabe a diferença entre os dois e Gengibre (Zingiber officinale) para quem ainda não entendeu nada desses nomes em Sânscrito!
Em breve falarei com maior profundidade sobre o gengibre, mas por enquanto saiba que ele é um Auṣadha: um grande remédio!
Se ainda tá difícil de entender a relação entre uma digestão prejudicada e uma dor de cabeça, teste essa receita de chá Anti Ama da próxima vez que exagerar no almoço e começar a sentir uma dor pesada na cabeça.
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Referências
1. DUARTE, Danilo Freire. Uma breve história do ópio e dos opióides. Revista Brasileira de Anestesiologia, v. 55, n. 1, p. 135-146, 2005.
2. SIMON, Eric J. Opioid receptors and endogenous opioid peptides. Medicinal research reviews, v. 11, n. 4, p. 357-374, 1991.
3. MAGHBOOLI, Mehdi et al. Comparison between the efficacy of ginger and sumatriptan in the ablative treatment of the common migraine. Phytotherapy research, v. 28, n. 3, p. 412-415, 2014.
4. DEVEREAUX, Andrea L.; MERCER, Susan L.; CUNNINGHAM, Christopher W. Dark classics in chemical neuroscience: morphine. ACS Chemical Neuroscience, v. 9, n. 10, p. 2395-2407, 2018.
5. PASTERNAK, Gavril W.; PAN, Ying-Xian. Mu opioids and their receptors: evolution of a concept. Pharmacological reviews, v. 65, n. 4, p. 1257-1317, 2013.
6. CHIDA, Noritaka. Recent advances in the synthesis of morphine and related alkaloids. In: Chemistry of Opioids. Springer, Berlin, Heidelberg, 2010. p. 1-28.
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